Um episódio de racismo no dia 2 de uma nova era mundial.
Meus irmãos e irmãs me pediram para contar uma história que pudesse ser publicada num livro sobre racismo. E eu, inocentemente disse que não tinha muitas histórias para contar. Um afro- brasileiro, educado num colégio caro e tradicional da zona sul do Rio de Janeiro geralmente saberia se virar. Tolo pretensioso…
Mas, graças à natureza humana, a sociedade carioca sempre me dá oportunidades criativas de falar sobre racismo.
Eu estava acompanhando uma parente no hospital Pró-Cardíaco e resolvi tomar um chocolate na excelente e tradicional cafeteria Violeta que se localiza no térreo do hospital. Cheguei ao balcão e uma senhora de cabelos brancos e aparência austera de matrona portuguesa, fazia anotações e olhava continuamente para parede atrás de mim enquanto atualizava suas notas.
Perguntei a ela se ela havia chocolate quente – minha primeira opção. Tal foi a ignorada que ela me deu que me senti no filme Sexto Sentido, onde o personagem principal falava com as pessoas e ninguém se apercebia a existência dele.
Nisso, passava por trás do balcão uma jovem de preto e formulei a pergunta a ela – vingativamente ignorei a matrona de volta.
A jovem me atendeu, super bem-educada e um tanto constrangida; anotou meu pedido e depois virou-se para a matrona dizendo: “Você não atende o cliente não ?”
Passando automaticamente de matrona a velha desaforada, a primeira funcionária respondeu: “- Você não está vendo que eu estou ocupada ? Era você quem deveria atender o cliente !!”.
É engraçado como tentamos entrar na lógica desengonçada do racista; mas também é engraçado como essa lógica não resiste a segundos de contradição própria. Digo isso porque, pouquíssimos minutos depois, enquanto a matrona ainda estava em suas anotações, chegou uma senhora claramente de origem ibérica, e fez uma série de perguntas sobre o menu, sendo simpáticamente atendida pela discípula de Domingos Jorge Velho.
Como vingança extra, não almocei lá, mas no “Bar Tero” na Paulo Barreto 110, com gente muito solícita e diversificada, uma IPA excepcional e um ótimo rosbife. Fiz questão de gastar bem. Eu mereço.
Sê o primeiro